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Viajando sozinha de carona pela América do Sul

Nasci em um teto sem piso no chão, mas entre mulheres guerreiras. Lá não tinha ninguém com parâmetros de viagens. Idas à praia nas férias ou uma esticadinha até uma cidade próxima no feriado largo não era parte da nossa realidade. Ninguém viajava. Quem diria ter dinheiro para viajar.

4min

Kami na estrada

Eu não falo inglês, nem fui à escola particular ou fiz intercâmbio cultural depois do ginásio. Conheci o mar com 21 anos. Aliás, vocês deviam ter visto minha cara: sentada na frente dele, com lágrimas e areias nos olhos de emoção de ver que realmente eu era pequenininha. Agradeci, como sempre.

Ainda muito nova, vi muitas coisas ruins passarem por mim. Por isso, acho que minha realidade atual - viajando de mochilão sozinha, pegando carona - não é nada mais do que uma aventura. Não tenho mais medos, o mal já passou por mim e eu mandei ele ir para longe.

Desde os 13 anos eu trabalho: feirinha do bairro, lanchonete, casa da tia, boliche da esquina, secretaria da escolinha. O que pintava, eu me metia. Dali saia os R$30, R$50 ou R$100 para juntar. Não importava quanto, sempre tentava guardar 30% do que eu ganhava.

Muita gente me pergunta "para que trabalhar, se não for pra ganhar dinheiro e gastar?". Você é louca de só juntar.

Nessas épocas, minha mãe, minha irmã e eu vivíamos de favores, e uma dessas vezes fomos mandadas para fora no meio da madrugada. Foi ali, com 11 anos que formei a ideia de comprar uma casa para minha mãe.

A batalha começou: trabalhei, trabalhei, paguei minha faculdade, paguei meus cursos e estudei para conseguir um emprego um pouco melhor. Eu acredito muito que a educação é o caminho para uma nova oportunidade de vida.

Kami na trilha

Sim, trabalhei para pagar minha chance de sair daquela realidade.

Tá bom. Cadê as viagens, a vida boa, as foto bonitas? Estou lendo esse texto para saber de viagens? Fico pensando que deve ser assim que as pessoas me vêem ou lêem.

Mas não tem problema, já chego lá.

Estudei, trabalhei muito e consegui ter um pouco mais de condições, o que me deu finalmente a oportunidade (ou liberdade) para ter novas ideias. Então, eu peguei o pouco que tinha e, com 21 anos, me joguei para minha primeira aventura de conhecer o mar.

Acabei saindo de Campo Grande, terra quente do Mato Grosso do Sul, para a geladeirinha de Curitiba, no Paraná.

Sofri com muitos nãos, mas consegui concretizar meu objetivo ali: estudar, trabalhar e juntar o possível para começar a pensar em dar aquela casa pra minha família lá na cidade de onde sai.

Passados seis anos, muitas batalhas depois, eu perdi minha vó. Quando se perde alguém que foi seu pai, mãe e avó, tudo junto, no meio de uma luta para dar uma melhor condição de vida para ela e não dá tempo, a cabeça vira dos avessos. A minha na verdade virou uma cabeça pensadora.

Foi com essa situação que me joguei no primeiro mochilão: o tradicional Peru, Chile e Bolívia. Foi aí que minha cabeça virou mesmo. Piadas à parte, Machu Picchu ferrou minha cabeça de vez.

Kami na ponte

Virei Mochileira. Virei não, despertei.

Desde desse dia, acho que os Incas têm me ajudado, porque voltei para o Brasil e botei pingos nos is. Comprei finalmente a casa para minha mãe, depois de tantos nãos dos bancos, consegui. Depois desse sonho e luta conquistados, trabalhei mais dois anos fixamente com a ideia: juntar o máximo para voar.

Virei entusiasta do minimalismo.

Não comprei nada. Nada de roupa, sapatos, perecotecos, coisas para casa. Nada. Isso me tornou consciente. Consciente do consumismo desnecessário e desenfreado que eu via nesse processo de libertação. Uma confirmação do que eu já sentia sobre a nossa sociedade consumista. Virei amiga dos recicladores e lixeiros também. Tanta coisa linda as pessoas jogam fora.

Eu sempre fui simples, tive uma educação muito de humildade e simplicidade. Ouro lá em casa era ter sorrisos e piadas no almoço de domingo na casa dos vizinhos ou com vaquinha da família para lasanha.

Nesses dois anos de experiências com o minimalismo eu aprendi muito sobre planejamento financeiro. Tudo sozinha, uma coisa levou a outra.

Em 2017 fui demitida e sai com um sorriso de agradecimento aos seis anos de empresa, afinal, o Universo conspira a favor para quem sonha e pede de verdade. Acreditem, é de verdade.

Logo, 2017 foi uma desconstrução e preparação para essa aventura.

No final, em março de 2018, saí de mochila, por terra, sem dinheiro.

“Mas peraí, você não juntou 2 anos para viajar?”.

Sim, mas eu gosto de desafios. Eu quis provar para mim mesma que não é questão de dinheiro o sonho de viajar. É de coragem.

Kami na cachoeira

Eu estou viajando há três meses a pé, de carona, com a mochila que posso chamar de casa, amorzinha, companheira, de couchsurfing e hostel. Tá só começando.

Não quero bancar a Supertramp não, só queria provar para mim mesma que a felicidade de viajar está no caminho que percorro, nas pessoas que conheço, nas aventuras que passo e com as rotas e situações que me ensinam no percorrido e nos campings selvagens, que a conexão que faço é minha natureza.

Tenho certeza, cada dia mais, que o mais valioso que consegui nessa vida não é a casa que comprei, a faculdade que fiz ou o dinheiro que juntei.

Eu não tenho nada.

Eu não vendo nada.

Eu só compro histórias.

Eu sou apenas uma moça, latino americana, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes. Vinda do interior, acho que Belchior me encontrou. Uma mulher que sonhou, acreditou e lutou (luta) para isso.

Eu só acredito no poder de transformação que uma viagem tem e estou aqui provando para mim mesma, porque eu sou uma viajante da natureza e mochileira por opção.

Estou cada dia mais certa que não tenho nada, não possuo nada. Nada, além de todas essas histórias.



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